Financial Times, menos uma joia da coroa ou a escolha de Sofia?

Sede do FT em Londres

Sede do FT em Londres

Em janeiro de 2008, durante visitas a jornais europeus que implementavam experiências de integração de redação off e online, tive a oportunidade de conhecer a redação do Financial Times. Ali, nas margens do Tâmisa, vi de perto as tentativas, já naquele momento somando dez anos, que o comando da redação fazia para produzir conteúdo digital de qualidade e integrado ao sofisticado e valioso conteúdo das edições impressas.

Além de usar um CMS avançado para acelerar os processos de integração, a redação já era totalmente orientada para o web first (sinto o cheiro de naftalina quando escrevo isso), com a publicação de todos os furos online, e contava com uma equipe de 20 pessoas apenas para a edição das homes do digital. A produção multimídia e a dedicada aos devices móveis ainda eram pequenas, mas já se ouvia no discurso das lideranças que essas demandas estavam crescendo e ganhariam maior prioridade no curto prazo.

Mesmo com tudo isso, com uma circulação digital que em cinco anos saltou de uma participação de 24% para 70% nas receitas gerais e com quase 750 mil assinantes digitais em seu paywall de US$ 53 mensais, hoje, quase oito anos depois, leio que o grupo Pearson anunciou a venda do FT para o grupo japonês Nikkei por US$ 1,3 bilhão.

A venda é mais um passo do gigante editorial da educação para enfrentar os desafios do mundo digital. Estava brigando nos últimos anos em duas frentes: no segmento da mídia e no da educação. Ambos sofrendo com a disrupção trazida pelas principais características da nova sociedade da informação: conteúdo online, on demand, veloz e gratuito.

O grupo já havia feito um forte reestruturação em 2013 para investir em educação digital, buscou uma maior participação nos mercados emergentes e no ano passado cortou 10% de seus quadros, 4 mil empregos. Com esse novo movimento, opta pela operação editorial e mantém no mercado de mídia apenas os 50% de participação na revista Economist.

FT.comE como fica o FT?

Nós, jornalistas que temos vivido essa forte transformação do negócio da informação, temos arrepios e sustos com esses movimentos tectônicos com os gigantes históricos da imprensa internacional. Foi assim quando a Amazon comprou o Washington Post, é assim quando o NYT apresenta seus resultados ou vende algum pedaço de seu império.

Apesar de ter 140 anos de experiência no mercado de mídia, o grupo Nikkei não traz consigo o mesmo prestígio e tem um perfil de produção de conteúdo totalmente diferente do FT. Seus produtos digitais são muito mais focados no mundo do entretenimento e os temas de economia e negócios são tratados de forma mais superficial. OK, a compra do FT pode ser um investimento para ocupar justamente esse outro território. Além disso, assim como o FT.com, o grupo japonês tem uma carteira de assinantes digitais poderosa e que tem aumentado a participação do digital nos negócios.

Que esse novo acionista não jogue por terra todo o esforço do FT no caminho da migração digital para a construção de um modelo de jornalismo de qualidade, sério e sustentável. We really hope.

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